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Sinto-me basáltica. Concreta, no brilho escuro das profundezas afectivas. As memórias cristalizam-me as vísceras. Movimentam-se em gestos compactos, activando a justa melodia de uma voz primária, instrumento de afinação absoluta.


Passo as mãos a seco pela topografia do texto. É interrompido e fosco. Pungente como um bom vinho. Não há nada tão revelador como a intensidade da luz, batendo certeira no vidro de uma janela imaginada. Todas as tardes são ecos desses diálogos originais. As palavras tropeçando vertiginosamente na vergonha partilhada, convertem-se num excesso de saliva difícil de engolir e percutir. 


Negociamos um acordo, argumentado com diferentes graus de silêncio. A ausência de palavras não nos liberta da análise inútil das nuances e significados. Planta-se segura no ventre, transformando a elasticidade dos tubos digestivos em ímpeto tectónico. 

Nasce assim uma história que inverte a sequência natural do processo narrativo. A distância aumenta durante o ritual de aproximação dos personagens. A partilha torna-se inversamente proporcional à intimidade.

Procuro conforto na geometria, nas leis fundamentais da física, no borbulhar quente e fecundo da geologia. Calo os psicanalistas e as suas cantigas hipnóticas de adoração à força centrípeta. Não há nada de errado com a geografia protectora das ilhas. Já me deitei outrora, em atitude esperançosa, caindo sôfrega na sua barriga áspera, tendo acordado saciada, coberta da magma e frutos doces, dádivas que incham carinhosamente o estômago, amaciando os cabelos da criança que responde pelo nosso nome.  

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Foto por Denise Pereira (Berlim, 2007)

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